Nota Pública sobre a ausência de tradutores e/ou intérpretes de Libras em aulas EaD nas Redes Públicas de Ensino

 

Tradução em Libras: Carlos Di Oliveira e Rogério Santos

Brasil, 13 de abril de 2020.

NOTA PÚBLICA SOBRE A AUSÊNCIA DE TRADUTORES E/OU INTÉRPRETES DE LIBRAS EM AULAS EAD NAS REDES PÚBLICAS DE ENSINO

 

A Federação Brasileira das Associações dos Profissionais Tradutores e Intérpretes e Guia-Intérpretes de Língua de Sinais – Febrapils – é uma entidade profissional autônoma, sem fins lucrativos ou econômicos, fundada em 22 de setembro de 2008. Temos a função de orientar, apoiar e consolidar as Associações de Tradutores, Intérpretes e Guia-intérpretes de Língua de Sinais (APILS), buscando realizar um trabalho de parceria em defesa dos interesses da categoria de tradutores, intérpretes e guia-intérpretes de língua de sinais (TILS).

Nossa Federação tem como norte de trabalho três eixos: a formação inicial e continuada dos Tradutores Intérpretes de Língua de Sinais (TILS) e Guia-intérpretes (GI); a profissionalização para refletir sobre a atuação dos TILS e GI à luz do código de conduta e ética e o engajamento político dos TILS e GI para construir uma consciência coletiva. Esta federação tem uma parceria firmada com a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (FENEIS) e trabalham juntas para promover, esclarecer e defender ações de acessibilidade linguística e cultural oferecida às pessoas surdas e surdocegas.

Nos posicionamos em defesa dos direitos das pessoas surdas e surdocegas, especialmente em relação à garantia de seus direitos linguísticos, de acessibilidade e de acesso à educação. Para tanto, elaboramos esta nota no intuito de ressaltar as garantias fundamentais das pessoas surdas para que a sua educação seja assegurada em igualdade com os demais cidadãos brasileiros.

O descumprimento de normas de acessibilidade por parte do sistema educacional da rede pública resulta no desrespeito aos direitos linguísticos de estudantes surdos ao não prover tradutores e/ou intérpretes de Libras para as aulas EAD disponibilizadas em canais virtuais.

Em relação a acessibilidade e inclusão de pessoas com deficiência, a partir da Constituição Federal Brasileira, diversas têm sido as legislações e normativas implementadas em prol da proteção individual e coletiva, da garantia de direitos, da igualdade e da não discriminação destas pessoas.

Um dos mais importantes instrumentos na defesa de direitos das pessoas com deficiência, incluindo pessoas surdas e surdocegas, é a Lei Federal nº 13.146/2015, que consiste na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência. Em seu artigo 3º, inciso IV, esta Lei estabelece como barreiras:

qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, […] entre outros.

Ainda, no mesmo artigo, em seu inciso V, tem-se como comunicação:

forma de interação dos cidadãos que abrange, entre outras opções, as línguas, inclusive a Língua Brasileira de Sinais (Libras) […].

Além disso, conforme disposto na mesma Lei, em seu artigo 8º:

É dever do Estado, da sociedade e da família assegurar à pessoa com deficiência, com prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, […] à educação, […] à informação, à comunicação, aos avanços científicos e tecnológicos, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, entre outros decorrentes da Constituição Federal, da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo e das leis e de outras normas que garantam seu bem-estar pessoal, social e econômico.

É fato que surdos e surdocegos brasileiros se deparam com diversas barreiras em diferentes espaços da sociedade. Considerando que a maior parte desta população têm a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como seu “meio legal de comunicação e expressão”, reconhecida pelo artigo 1º da Lei Federal nº 10.436/2002, entendemos que os obstáculos enfrentados, principalmente pela privação linguística e barreiras comunicacionais, são contrários ao gozo, fruição e devida efetivação de seus direitos fundamentais elencados pela Constituição Federal, complementada, com status de emenda constitucional, pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Decreto no 6.949/2009).

Neste sentido, destacamos que, sendo a Educação um dos Direitos Fundamentais previstos pela Constituição, e em consonância com o excerto da Lei  nº 13.146/2015 exposto acima, reforçamos que cabe ao poder público garantir a promoção deste direito às pessoas surdas, em igualdade com os demais, removendo quaisquer barreiras que possam ser impostas, seja na modalidade de educação presencial ou à distância.

Tendo em vista as barreiras enfrentadas pelos estudantes surdos e surdocegos, entendemos que o profissional tradutor e/ou o intérprete, cuja profissão é regulamentada pela Lei Federal nº 12.319/2010, se configura como um dos meios de garantir a acessibilidade, promovendo o acesso à educação. Portanto, compreendemos que a ausência de TILS e GI no âmbito educacional, em qualquer nível ou modalidade que seja, limita a plena participação dos surdos e surdocegos na sua formação escolar acadêmica, violando direitos humanos e fundamentais, ao não garantir tratamento igualitário a estes educandos.

Com bases nos argumentos e previsões legais expostas acima, esta Federação recomenda:

  1. Aos organizadores das aulas EAD das Secretarias de Educação, que insiram tradutores e/ou intérpretes de Libras em todas as gravações veiculadas nos canais dispostos pela instituição.
  2. Que planejem com antecedência questões de acessibilidade, incluindo previsão de recursos e/ou parcerias que garantam serviço de tradução, interpretação. No caso de estudantes surdocegos com baixa visão, que seja discutida com os profissionais sobre ampliação de tela.
  3. Que as Secretarias de Educação forneçam canal(is) de comunicação acessível(is) para o atendimento de pessoas surdas que irão participar das aulas e classes à distância, assegurando os meios e recursos para tal efetivação.
  4. Que a equipe de profissionais TILS e/ou GI contratados tenha a oportunidade de planejar prévia e adequadamente sua tradução para a Libras, tendo acesso ao conteúdo a ser traduzido com tempo hábil para preparação e estudo.
  5. Que se dê preferência a tradutores com experiência em interpretação EAD e, se possível, a contratação de tradutores surdos para auxiliar nas interpretações e revisão dos materiais de aula a serem traduzidos.
  6. Que o tamanho da janela de inserção assim como a iluminação siga as normas da Norma Brasileira (NBR) 15.2901 e a Nota Técnica N° 01/2017 da FEBRAPILS que dispõe sobre aAtuação do Tradutor, Intérprete e Guia-intérprete de Libras e Língua Portuguesa em materiais audiovisuais, televisivos e virtuais.
  7. Que as Escolas Bilíngues para Surdos tenham seu espaço garantido na produção de aula EAD e a veiculação em canais de acesso, no sentido de garantir material adequado que contemple a língua de sinais e a ludicidade da pedagogia visual para surdos.

A Febrapils se coloca à disposição para dialogar, prestar mais esclarecimentos, ou, ainda, colaborar no que for necessário.

Contate-nos em: febrapils.dialogos@gmail.com / dirsul.febrapils@gmail.com

Atuaram na produção deste documento:

Hanna Beer Furtado – Tradutora, intérprete. Diretora Regional Sul – Febrapils

Jonatas Rodrigues Medeiros – Tradutor, intérprete. Diretor Regional Sul Adjunto -Febrapils

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